Vivemos em um
momento em que a sociedade é completamente envolta e praticamente dependente da
tecnologia. O seu uso é indispensável nos vários setores da sociedade, com os
objetivos que podem ser de acelerar a realização de atividades, ter segurança e
agilidade na transmissão de dados e informações, tornar algumas ações menos
burocráticas, garantir acesso rápido e a um número maior de pessoas em um tempo
menor, dentre vários outros e distintos objetivos.
O espaço escolar,
como parte da sociedade que é, também se vê de certa forma obrigado a fazer
parte deste mundo tecnológico que a era da informação e do conhecimento nos
impõe, até porque a escola é formada por pessoas que estão inseridas nesse
contexto tecnológico e por esse motivo , de uma forma ou de outra, ela precisa
fazer uso dos recursos que as TIC’s ( Tecnologia da Informação e da
Comunicação) nos oferece.
Nessa
perspectiva se faz necessário pensar em como essas tecnologias têm sido
introduzidas na escola e com qual objetivo. O que se percebe através de
depoimentos e das próprias vivências é que muitas vezes os instrumentos
tecnológicos têm sido apenas substitutos de outros recursos didáticos, o que
perpetua uma prática pedagógica que tem como foco o ensino e não o aprendiz.
Papert ratifica essa ideia quando diz que “a maior parte de tudo o que tem sido
feito até hoje sob o nome genérico de “tecnologia educacional” ou “computadores
em educação” acha-se ainda no estágio da composição linear de velhos métodos
instrucionais com novas tecnologias” (PAPERT, 1985, p 56). Nesse sentido, vale
retomar aqui uma discussão que se tem sobre a função da escola e o papel do
professor no processo de aprendizagem.
Historicamente a
escola voltou seu olhar apenas para o ensino sem se preocupar com a
aprendizagem do educando. Ela se preocupou com a preparação das pessoas para o
mundo do trabalho e esqueceu-se de preparar os educandos para pensar, para
construir a sua aprendizagem.
Partindo dessa
perspectiva, a partir do século XX estudiosos como Piaget e outros se dedicaram
a estudar o desenvolvimento e a aprendizagem dando-nos suporte para compreender
que a aprendizagem é um processo.
O construtivismo
de Piaget, por exemplo, nos revela que o indivíduo constrói sua aprendizagem e
essa construção se dá em relação com o mundo e individualmente, de forma ativa.
A teoria de Piaget tem um caráter psicológico e não educacional, no entanto, é
necessário aplicar seus conceitos no cotidiano escolar, adaptados ao campo
pedagógico. Nesse sentido, Papert, a
partir dos estudos de Piaget, propõe o construcionismo que é a aplicação
pedagógica do construtivismo.
Papert (2008,
p.135) diz que:
O construcionismo é construído sobre a
suposição de que as crianças farão melhor descobrindo por si mesmas o
conhecimento específico de que precisam; a educação organizada ou informal
poderá ajudar mais se certificar-se de que elas estarão sendo apoiadas moral,
psicológica, material e intelectualmente em seus esforços. O tipo de
conhecimento que as crianças mais precisam é o que as ajudará a obter mais conhecimento.
Ao propor o
construcionismo, esse autor defende o máximo de aprendizagem com o mínimo de
ensino e para isso nos apresenta a proposta do uso das tecnologias no espaço
escolar como ferramenta que possibilita a construção ativa e significativa do conhecimento.
Em seu livro
LOGO: computadores e educação, Papert fala especificamente como os
computadores, enquanto instrumentos tecnológicos, afetam a maneira das pessoas
pensarem e aprenderem, desde que não sejam utilizados de forma que o computador
ensine a criança o que fazer, que lhe mostre o que é certo ou errado, que
“programe a criança”. Segundo Papert (1985) a criança é que deve programar o
computador, pois ao fazer isso “ela adquire um sentimento de domínio sobre um
dos mais modernos e poderosos equipamentos tecnológicos” (PAPERT, 1985, p. 18)
e ao fazer isso é possível mudar a maneira como as diversas aprendizagens
acontecem, como Papert ainda afirma: “as crianças podem aprender a usar o
computador habilmente e essa aprendizagem pode mudar a maneira como elas
conhecem as outras coisas [...]” (ibidem,
p 21).
No entanto, o
que temos visto é que muitas crianças têm acesso a computadores, seja na escola
ou em casa, contudo o uso que se faz da máquina não tem permitido o
desenvolvimento do pensar, haja vista o mesmo ser notado apenas como um
instrumento de exercício e prática, com atividades repetitivas que visam apenas
verificar se a criança ou aluno acertou ou errou. Isso denota a concepção que a
sociedade de certa forma tem sobre conhecimento, sobre a aprendizagem, que deve
ser programada, com respostas prontas, sem permitir ou compreender que a
aprendizagem é um processo, que o conhecimento é construído e que o erro é
construtivo, pois nos impele a tentar outra vez, de outra forma, por outros
caminhos, até chegar a resultados mais satisfatórios. Nesse processo de
tentativa e erro o pensamento é exercitado, o sentido lógico é construído, a
criança é estimulada a pensar sobre o pensar, ela discute com seus pares suas
experiências, testa novas ideias e assim passa a ter um pensamento menos
mecânico pois ela não é controlada pela máquina,
mas ela sim é quem controla, ela de certa forma ensina o computador a “pensar”.
E ao ensinar o computador a “pensar” a
criança embarca numa exploração sobre a maneira como ela própria pensa. Pensar
sobre modos de pensar faz a criança torna-se um epistemólogo, uma experiência
que poucos adultos tiveram (PAPERT, 1985, p 35).
2. O
USO DO COMPUTADOR NO ESPAÇO ESCOLAR
Quando falamos
no uso do computador no espaço escolar não nos detemos a falar da máquina em
si, pois para o seu funcionamento é necessária a existência de programas, de
softwares, que viabilizem seu uso de forma adequada para o alcance dos
objetivos propostos.
A cada dia esses
programas são aperfeiçoados em todos os aspectos. Os engenheiros da computação
aperfeiçoam graficamente e esteticamente
a cada dia esses programas que têm imagens muito próximas do real, que nos
permitem perceber detalhes imperceptíveis ao olho nu e talvez jamais imaginados
por alguns. A riqueza dos detalhes, das possibilidades, envolve, fascina o
usuário, no entanto é primordial ter um olhar mais apurado para esses
programas, um olhar que vá além de perceber o estético, o encantador, mas um
olhar que permita verificar a possibilidade da construção do conhecimento a
partir desses softwares.
É interessante
quando Papert coloca ainda em seu livro LOGO: computadores e educação, que para
os projetistas de computadores, engenheiros da computação, de certa forma é
cômodo produzir programas para serem utilizados no mundo da educação, pois se
tem a ideia do computador apenas como algo semelhante aos métodos tradicionais
de ensino, só que em uma configuração mais moderna , atual e lúdica.
Para os projetistas é fácil, pois esses programas “[...] são
previsíveis, simples de descrever e eficientes no uso dos recursos da máquina” (PAPERT,
1985, p.55). Nesse sentido, pensamos qual o significado realmente de fazer uso
de computadores na escola, de investir tantos recursos financeiros em
tecnologias cada vez mais modernas se com seu uso não há mudança de pensamento.
Vale salientar
aqui, e é imprescindível ter bem claro que os engenheiros de computação têm
apenas o papel de criar as máquinas, os softwares, mas o objetivo do seu uso,
no espaço escolar de uma forma específica, é de responsabilidade do professor,
que além de traçar os objetivos para o uso de um software deve ter a
consciência de qual é o seu papel no processo de aprendizagem.
Partindo dos
pressupostos defendidos por Vygotsky (2003) o professor não pode ser aquele que
instrui no sentido de dizer o que deve ser feito. Ele deve sim assumir o papel
de mediador, o que não significa ser um contemplador, avaliador ou observador,
mas sim alguém que colabora ativamente com a construção do conhecimento do
educando, que interage.
A partir dessa
relação de mediação entre o educando e o educador, que acontece na ZDP (Zona de
Desenvolvimento Proximal), passa a existir a possibilidade do educando não
apenas resolver situações problemas, de não apenas saber algo ou sobre algo,
mas também saber partilhar o conhecimento construído, iniciando assim um processo
de socialização.
A bem da
verdade, há alguns projetistas que têm uma concepção diferenciada, como por
exemplo Seymour Papert, já tão citado neste trabalho, que já projetam seus
produtos objetivando que o usuário não seja apenas um executor de atividades
repetitivas, mas seja um programador que construa conhecimento a partir do uso
dos programas. Papert com um grupo de pesquisadores do MIT - Massachusetts
Institute of Technology, criou o LOGO, um software que permite a criança estar
no controle da máquina, sendo o programador, ensinando o computador a pensar e
não vice versa.
Poderíamos aqui
fazer uma grande lista de softwares que são denominados educativos ou
educacionais, no entanto, partindo do pressuposto que o que determina se ele
tem esse caráter ou não é o uso que se faz dele, nos deteremos neste trabalho a
verificar as possibilidades e eficiência de apenas um software.
Cabe destacar
aqui, como Fino (1998) afirma, que “o software educativo deve funcionar como
ferramenta de mediação da aprendizagem e da cognição”. Ele deve também, ainda
de acordo com Fino (ibid) “dar acesso
a micromundos ricos em nutrientes cognitivos” que permitam uma atividade
significativa, que estimule o desenvolvimento cognitivo, permitindo a
manipulação com a ajuda de um outro mais capaz ( par ou professor), que permita
a colaboração, que estimule atividades metacognitivas, que favoreça a negociação social do conhecimento, que
estimule a colaboração com os outros, que possibilite a interação, dentre
tantas outras possibilidades que devem
ser propiciadas e habilidades que podem ser desenvolvidas por um software que de fato é educativo.
Ainda segundo
Fino (ibid) o software para de fato
ser educativo, deve permitir ao aprendiz a iniciativa, deve consentir ganhar e
testar competências, deve possibilitar uma exploração diversificada em que o
controle seja do usuário.
É mister aqui salientar que ao avaliar um software não
se deve deter a fichas, a grades de avaliação com inúmeros itens que vão desde
o aspecto técnico até o aspecto pedagógico, mas sim verificar se os aspectos
citados anteriormente são observáveis. Isso não implica dizer que o uso desses
instrumentos para registrar a avaliação do software seja impraticável, no
entanto as grades de avaliação, de certa maneira, limitam a avaliação.
Partindo dessa
perspectiva, nos detemos a analisar um software bastante conhecido, presente em
todas as máquinas e que pouco é utilizado com o fim realmente educativo no
sentido já apresentado ao longo deste trabalho (pelo menos quando observamos as
escolas do Brasil e de uma forma mais precisa as escolas do interior da Bahia
as quais temos mais contato) - o WORD,
que é um editor de textos que faz parte do pacote da Microsoft Office (com o
perdão de fazer merchandising).
3. AVALIANDO O WORD
Para verificar o
caráter educativo de um software se faz necessário perceber se ele favorece o
desenvolvimento das habilidades que possibilitam a construção ativa do
conhecimento e atende os requisitos e características já citadas ao longo de
todo este trabalho. Assim, partindo desse ponto de vista , quando nos detivemos
a avaliar um software, nesse caso específico o WORD, procuramos seguir uma
linha de pensamento para nortear a avaliação, a saber:
·
Permite a construção de conhecimento de forma
ativa;
·
Estimula a colaboração;
·
Estimula o exercício da autonomia;
·
Permite a colaboração entre diferentes
aprendizes;
·
Favorece a busca da aprendizagem que o educando
necessita e deseja aprender.
É bom destacar
que esses são apenas princípios norteadores e não se encerram em si. De certa
forma, estes podem ser considerados o ponto de partida de análise, sendo que ao
longo da observação do uso, a longo tempo, observando também o resultado desse uso,
pode-se acrescentar novos indicadores, até porque a utilização dos softwares na
educação deve ampliar, gradativamente, as competências e habilidades
desenvolvidas no indivíduo, afinal não há limites para o conhecimento – sempre há
muito a conhecer.
3.1 OBSERVANDO O USO DO WORD PARA OUSAR UMA
AVALIAÇÃO.
Ao avaliar o
WORD, nos propomos a acompanhar um usuário que já fazia uso deste “software”,
que já tem domínio da linguagem escrita convencional, mas que sempre fazia o
uso do mesmo de forma limitada, para mera digitação de textos.
A partir de uma
situação problema, em forma de desafio pelo mediador para que fosse criado um
texto criativo e atraente, sem determinar tema, foi iniciada a observação de
uma criança fazendo uso deste software.
A princípio a criança solicitava que o tema para a produção do texto
fosse dado, mas sob a orientação do professor da necessidade que o usuário tem
de dar asas à imaginação, pensando em alguém que ela quisesse mandar uma
mensagem atrativa e criativa, a criança foi se liberando da ideia já arraigada
de que é necessário que alguém diga o que e como fazer.
É importante
destacar que pela prática comum das escolas seguirem um currículo fechado e
pré-determinado, pelos próprios indivíduos estarem habituados a ouvir as
instruções do que deve ou não deve ser feito, é difícil sentar com uma criança
e deixá-la fazer uso livre de um software qualquer, pois a sua mente está tão
cauterizada que ela é incapaz, em um primeiro momento, de tomar a iniciativa
para ver as possibilidades do uso do instrumento que lhe é apresentado.
Em se tratando
do WORD, software escolhido para nossa avaliação, essa dificuldade se acentua,
pois em todo e qualquer editor de texto a aparência não é convidativa,
atraente, principalmente se o usuário é uma criança pequena que gosta de cores
e movimento.
No entanto, o
que se observa é que ao longo do uso do programa, com a presença ativa do
mediador, esse usuário começa a ver as possibilidades. É possível verificar que
o programa não precisa ser usado apenas para digitação, para transcrição de
algo que estava no papel. Auxiliado pelo mediador, ele percebe que tem a
capacidade de dominar o texto e deixá-lo da forma que ele julga mais
interessante, inserindo imagens, gráficos, formas, cores, que permitem tornar o
texto mais atraente.
Quando essa
criança (usuário) senta ao lado de outra que também tem a missão de construir
um texto que seja atrativo para o leitor, ele compartilha as descobertas, as
estratégias, mostra as possibilidades de edição. Com o passar do tempo ele
percebe que criar um texto vai muito além de meramente digitar palavras, pois
com a ajuda de imagens e gráficos, aliados ao texto, é possível transmitir a
mensagem desejada com mais emoção.
Diante dos
pontos norteadores para a avaliação do software que fora supracitado podemos
asseverar que com o uso do WORD é possível que o usuário construa seu
conhecimento, no seu ritmo, de acordo com sua necessidade e seu desejo. Ele
permite o exercício da autonomia, permite a colaboração entre aprendizes, mas
exige que o responsável pela mediação desse processo esteja atento e não caia
na tentação de ser um mero instrutor, mostrando o que o usuário deve fazer, mas
deixando-o livre para isso.
O uso do editor
de texto WORD também permite uma relação com os conteúdos do currículo escolar,
apesar de que esse não é um fator que vá garantir a denominação de software educacional,
mas vale aqui apontar que existe também essa possibilidade.
4. PARA CONCLUIR...
Enfim, podemos
concluir este trabalho dizendo que seria arbitrário dizer aqui simplesmente se
o software avaliado – o WORD - é educativo ou não, haja vista ser uma questão
de uso que vai definir isso, como bem afirma Fino (2003).
Devemos ter bem
claro em nossas mentes que não é necessário, não é obrigatório denominar ou
rotular um software como educacional ou não, pois definir limita e o
que desejamos é não ter limites para que o conhecimento seja construído. É
necessário entender sobre a possibilidade do uso educacional do software, se
ele vai favorecer a autonomia, vai estimular o educando ir em busca das
aprendizagens que necessita e deseja aprender, refletindo sobre como aprendeu.
Isso sim é o que vale!
REFERÊNCIAS
FINO, C. N. Vygotsky e a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP): três
implicações pedagógicas. Revista Portuguesa de Educação, vol. 14, nº 2, pp 273-291,
2001.
______. Um
software educativo que suporte uma construção de conhecimento em interação (com
pares e professor). IN: Actas do 3º Simpósio de Investigação e
Desenvolvimento de Software Educativo (edição em cd – rom ).Évora :
Universidade de Évora, 1998.
____________. Avaliar software “educativo”. IN: Actas da III Conferência
Internacional de Tecnologias de Informação e Comunicação na Educação (pp.689 –
694). Braga: Universidade do Minho, 2003.
PAPERT, Seymour. A Máquina das Crianças – repensando a escola na era da informática.
Ed. Ver. Porto Alegre: Artmed, 2008.
______. LOGO:
computadores e educação. São Paulo: Editora Brasiliense, 1985.
VYGOTSKY, Lev. A Formação Social da Mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos
superiores. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
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